sábado, 16 de março de 2024

pressão e depressão

 

Certo dia, estando em trabalho num festival em Dublin, Irlanda, e devido à minha mania de nunca falhar nenhum horário, nenhum compromisso, dei cabo dos nervos a um dos meus condutores, que não me aguentando mais, me disse, Pressure only on the tyres!!! Isto é, pressão só nos pneus! Aprendi ali uma boa lição! Realmente estarmos sempre a pressionar alguém, pouco ou nada resolve ou pode até piorar. Muita pressão pode dar estoiro do pneu e se for numa pessoa pode dar depressão. É sobre esse estado de doença que vou hoje aqui escrever.

Não sendo um mortal cancro, nem uma perna partida e nem sequer uma tosse persistente, a depressão é uma doença terrível, ocupando o segundo lugar das doenças incapacitantes. É uma maleita muitas vezes invisível, muitas vezes escondida, muitas vezes acabando em suicídios aparentemente inesperados. Na depressão escondemo- nos dos outros. Do mal só sabemos ir para o pior. Dentro dela entramos em rodopio galopante de aflição interior. Esse rodopio gera-nos uma ansiedade em circuito fechado que nos vai dilacerando a alma e mortificando o corpo.

Não sou dos poucos que a conhecem pessoalmente, dado que 3 em cada 10 portugueses já foram com ela diagnosticados e 6 em cada 10, já viram os seus sinais em algum momento da sua vida. Entre 30% e 60% dos portugueses sabem do que estou a falar, sinceramente espero que não seja o teu caso.

Na depressão não há amor, nem pelos outros, nem por nós próprios. Na depressão desamamo-nos.
Mesmo no meio de qualquer festa, onde reina a alegria e a felicidade, a depressão é um

vampiro que se alimenta das entranhas mais escuras da alma humana. É mais uma daquelas doenças que não escolhe idade, género ou estatuto social; ela pode invadir a qualquer pessoa, deixando marcas bem profundas na vida de cada doente.
Quando damos por ela, estamos num turbilhão de tristeza e desespero. Cada dia é um tormento, cada simples acção se transforma num obstáculo intransponível. Conseguir levantar da cama já é uma enorme vitória, quando o peso do universo esmaga cada ideia do nosso pensamento. A apatia controla todos os caminhos da nossa esperança.

Fora de nós tudo é distante e irreal, enquanto do lado de dentro continua a escuridão mais profunda. Nem memórias guardamos de qualquer alegria passada. Presente, passado e futuro são um tempo sem fim, onde todas as medidas medem a dor que nem gritar consegue. Uma dor escondida, muitas vezes só mostrada por um corpo pendurado numa corda, no fundo do poço, estilhaçado por um comboio, espumando veneno pela boca e outras tantas formas de suicídio.

Portugal ocupa o segundo lugar na OCDE no consumo de anti-depressivos, gastando o estado cerca de 60 milhões de euros por ano. Não sendo de desprezar o tratamento médico farmaceutico, julgo essencial mais atenção nas causas da depressão, sendo a mais evidente, a pobreza. É um lugar comum dizer-se que a depressão é uma doença de ricos. Que grande mentira esta, no máximo se pode afirmar que é uma doença de pobres em países ricos.

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